Homens de Deus a exemplo de São José

O Filho do carpinteiro

Estamos no Ano Josefino, proclamado pelo Papa Francisco. E neste mês de março, no dia 19, celebramos a festa de São José. Por isso, resolvi recordar uma reflexão feita no ano de 2017 durante o Encontro Quaresmal para Homens, ocorrido no dia 19 de março daquele ano, no Colégio Nossa Senhora das Dores, em Nova Friburgo, sob organização da Pastoral Familiar da Catedral de São João Batista. O tema foi “Homens de Deus a exemplo de São José”.

Passei a maior parte da minha vida atuando pastoralmente na Igreja do Rio de Janeiro, e foi conhecendo um pouco sobre mim que o Padre Marcus Vinicius, então pároco da Catedral de São João Batista e vigário geral da Diocese de Nova Friburgo, me convidou e me confiou a missão de apresentar uma reflexão sobre a pessoa de São José como modelo para nós, homens.

Participantes da Palestra Homens de Deus a exemplo de São José

Quem foi São José?

Apesar de ser católico desde meu nascimento, confesso que nunca prestei muita atenção ao pai adotivo de Jesus.

Geralmente, nosso olhar de devoção recai sobre Nossa Senhora, que indica o Salvador, seja na Anunciação, no Magnificat ou nos muitos outros breves momentos, mesmo que de forma humilde e silenciosa.

São José, acredito, passa despercebido para a maioria dos católicos.

Talvez alguns apenas o tenham como “esposo de Maria”, um mero “apoio” para encobrir os mexericos e o “disse-me-disse” ante o possível escândalo inevitável da futura mãe solteira que iria ser Maria.

Outros o têm como simples “pai adotivo de Jesus”, com toda a carga de assumir o que não era seu.

No início desta palestra eu me apresentei, agora quero apresentar a vocês quem é São José, ou melhor, quem eu estou descobrindo ser São José.

No primeiro capítulo do Evangelho de São Mateus, versículos 18 e 19, lemos: “Eis como nasceu Jesus: Maria, sua mãe, estava desposada com José. Antes de coabitarem, aconteceu que ela concebeu por virtude do Espírito Santo. José, seu esposo, sendo justo, não querendo difamá-la, resolveu rejeitá-la secretamente.”. Daí, vem o título de São José, o justo.

Na Bíblia, a palavra “justo” não é apenas a virtude moral de dar o que é de direito a alguém, mas reúne as perfeições que qualificam um homem totalmente centrado na Lei e na Vontade de Deus. Ser justo é ser santo.

Para esposo de Maria, para cuidador e zelador do Filho de Deus Encarnado e provedor da Sagrada Família, Deus não escolheria ninguém menos senão um homem íntegro e fiel, ou seja, um homem justo e santo.

Eu posso até me arriscar a dizer que São José não é menor que Maria Santíssima, se não considerarmos a Imaculada Conceição da Mãe de Deus e a sua predestinação desde toda eternidade a ser a Mãe do Salvador, acolhendo em seu ventre o fruto do Espírito Santo. Como Maria, José também deu o seu SIM a Deus para a obra da redenção.

Nas Sagradas Escrituras, se não observarmos com cuidado, quase não notaremos a pessoa de José. Não há registros de sua fala.

Nos Evangelhos de Mateus e de Lucas, ficamos sabendo que Maria desposou um homem chamado José, da tribo de Davi.

Assim como Maria, José também recebeu a visita de um anjo, que em sonho lhe disse que a obra ocorrida em sua noiva era fruto do Espírito Santo (Mt 1,20). Além de justo, José era um homem de fé. Ele confiava e esperava plenamente em Deus.

Por três vezes, Deus se manifesta a José através de sonhos, o que denota, dizem alguns estudiosos das Sagradas Escrituras, que ele era um homem profundamente contemplativo e aberto aos sinais de Deus até durante as vigílias do sono.

São José que dorme e que ouve e acolhe a vontade de Deus

Engraçado observar isso, pois a figura marcante que nos chega de José é de um operário. E realmente ele era um. Um artesão que ganhava a vida por meio de seu trabalho como carpinteiro.

Em José temos a excelência do lema beneditino: “Ora et Labora”, isto é, reza e trabalha.

É das mãos de São José que nascem suas obras: um móvel, um utensílio… Como artesão, José reflete o seu Criador. Verdadeiramente ele é imagem e semelhança de Deus. E é das atitudes de São José que nasce a Sagrada Família. Deus quis contar com José para realizar sua obra de Salvação.

Maria Santíssima é a nossa corredentora, pois a redenção de nossa alma aconteceu por seu intermédio. Bendito ventre que acolheu o Salvador do Mundo! São José é o colaborador de Deus, ou seja, aquele que trabalha com Deus e apoia a obra da redenção.

Assim, formamos a nossa primeira imagem do santo que hoje refletimos:

  • São José, o santo, o justo. Aquele que soube centrar-se nas coisas de Deus. Vigilante, contemplativo, atento.
  • São José, operário, carpinteiro, trabalhador. Aquele que faz do seu trabalho oportunidade para promover a vida.

ReflexãoQuem é você? O que você faz? Em que trabalha? Como vive no seu ambiente familiar?

A humanidade de São José forma a humanidade de Jesus

Coube a José o cuidado e a formação daquele que seria o Messias.

No tempo de Jesus, cabia ao pai dar o nome ao filho em sua primeira apresentação no templo, quando se fazia a circuncisão do menino e se apresentava oferendas a Deus.

Mesmo sendo Nossa Senhora também descendente do Rei Davi e parente próxima do seu esposo, é na genealogia de José que Jesus é apresentado como sendo o Filho de Davi.

Tanto São Mateus, logo no seu primeiro capítulo, como São Lucas, no segundo capítulo do seu Evangelho, apresentam a genealogia de Jesus. Isso é um fator extremamente importante, pois realça como o povo hebreu valorizava sua origem e sua história. Inclusive, isso foi um forte fator diferencial que permitiu ao povo hebreu manter-se coeso apesar de 400 anos de escravidão no Egito.

Em hebraico, família significa “casa do pai” (Bêt’Āb). Isso nos leva a entender a importância de São José no contexto familiar.

Talvez hoje, pelo fato de as mulheres terem entrado no mercado de trabalho e dividirem tarefas com os homens; talvez por que as famílias atualmente estejam tão desfiguradas, nós não consigamos perceber direito a importância da participação de São José. Como eu disse antes, nossos olhos se voltam quase sempre à Nossa Senhora, por ela ter gerado o Filho de Deus e ter sido concebida sem a mancha do pecado original.

Todos os homens recebiam uma educação básica, que incluía ler pelo menos as Escrituras. Cabia ao pai a educação dos seus filhos. Muito provavelmente as parábolas narradas por Cristo, quando adulto, devem ter sido apresentadas por José, durante sua infância e adolescência, como forma de explicar as tradições e as leis mosaicas.

ReflexãoQual é o seu papel em sua família ou em sua comunidade? Qual é a sua missão e a sua responsabilidade?

Canal de Graça

“Contra toda expectativa humana, Deus escolheu o que era tido como impotente e fraco para mostrar sua fidelidade à sua promessa.” (CIC 489)

Maria se destaca por sua Imaculada Conceição. Já José trazia, como nós, a marca do pecado original.

Imaginemos então quão incrível não foi a vida desse homem ao lado de uma mulher predestinada desde toda a eternidade a ser plenamente cheia de graça.

Em primeiro lugar, podemos pensar quantas bênçãos recebeu por intermédio de Maria. E também quão heroica e virtuosa não foi a sua vida, para corresponder ao específico chamado.

Se Maria é cheia de graça e irradia bênçãos sobre todos nós, José, como ninguém, soube ser receptor dessas graças; e também canal para Jesus, que, obediente, lhe era submisso (cf. Lc 2, 51a. 52). São José recebeu e transbordou.

Isso nos faz lembrar daquele ditado popular: “Diga-me com quem tu andas e eu te direi quem tu és”. São José, cercado de graças, só podia transbordar graça e amor.

E nesse transbordamento, ele foi o elo da Sagrada Família com Deus. É significativo e interessante observar que depois que Maria se casou com José, ela não recebeu mais nenhuma visita de anjos e nem chegou a ela alguma mensagem direta de Deus. Era por intermédio de São José que Deus dava as orientações para a Sagrada Família, haja vista a fuga para o Egito (Mt 2,13) e o retorno a Nazaré (Mt 2,19).

Este é um belo sinal de que nós, homens, temos todos um importante papel na família: sermos canal de graça.

ReflexãoVocê tem sido canal de graça para a sua família? Você está atento à voz de Deus, contribuindo para que sua família caminhe na vontade do Criador? Com quem você tem andado? Quem são seus amigos?

A lição do Silêncio

A escola de Jesus se dá no silêncio e na obediência de Nazaré. Com seus pais, Ele aprende e vive o quarto mandamento: “Honrar pai e mãe”, isto é, uma lição de vida familiar, comunhão de amor, carinho e simplicidade.

São José, com certeza, foi um grande educador – “pelos frutos conhecereis a árvore” (Lc 6,44). Se admiramos Jesus – Caminho, Verdade e Vida –, podemos admirar seu pai adotivo que foi para ele exemplo. Exemplo de trabalho, dedicação à família e de estudo e oração.

Muitos fazem conjecturas sobre a misteriosa infância de Jesus. Como ele teria vivido? Por que não existem relatos sobre esta etapa da vida dele?

Acredito que este período foi de puro aprendizado e os educadores foram seus pais. São Lucas diz em seu Evangelho que Jesus “crescia em estatura, em sabedoria e graça, diante de Deus e dos homens” (Lc 2,52). Nada mais é dito, mas é o suficiente. O silêncio dessa época revela o cotidiano familiar. Jesus viveu o ordinário primeiro para depois viver o extraordinário. E, com certeza, houve aí grande influência de José.

ReflexãoQue influência você está causando em seus filhos? Há em sua casa a cumplicidade e intimidade natural de uma família bem estruturada? 

Confiança sem reservas

Quando vejo que José, imediatamente após ser instruído por Deus, deixou sua casa e fugiu com Maria grávida para o Egito, penso na loucura que foi essa experiência.

Hoje em dia temos WazeGoogle Maps, celular, carro, avião, cartão de crédito, além de milhões de outras comodidades e mesmo assim, titubeamos frequentemente com medo de dar um passo falso.

José era o protetor da Sagrada Família e como pode agiu! Com um burrico e uma trouxa de comida, dirigiu-se para o deserto, subindo montanhas, andando por estradas sem nenhuma sinalização.

José confiava em Deus e em sua Divina Providência.

Hoje em dia, dizemos uma jaculatória: “São José, providenciai!”. De providência, realmente ele entende.

Ele soube se abandonar completamente nas mãos de Deus.

Se em Belém, cidade de seus antepassados, José não conseguira hospedagem digna para o nascimento de seu Filho, como ele fez no Egito, lugar estranho com língua estranha? Como conseguiu manter sua família pelo tempo que durou sua estadia naquele país?

“Confiai-lhe todas as vossas preocupações, porque Ele tem cuidado de vós.” (I Pe 5, 7)

Eu aprendi com Dom Rafael Cifuentes, bispo emérito de Nova Friburgo, uma lição que guardo até hoje. Ele sempre dizia em suas pregações: “Deus nunca se deixa vencer em generosidade”. A providência divina da qual São José era um profundo conhecedor e experimentador (se posso dizer assim) nos revela esse cuidado extremo e dedicado de Deus por nós.

Pensemos o seguinte: para Deus nos vencer, é preciso que estejamos na “disputa”, ou seja, empreendendo, fazendo a nossa parte, e aí Ele nos supera.

Assim foi com José. Deus se fez presente porque José cumpria com suas obrigações. Fazia o que lhe cabia. 

Ele era justo, lembra? Ele dava o que é de direito a quem cabe, e mais, fazia de sua justiça um modo de ser santo, isto é, como justo centrava-se na plena vontade de Deus.

ReflexãoQuais são as suas preocupações? Você já ficou desempregado, sem comida em casa? Já passou alguma espécie de necessidade? Você já experimentou viver na e da Providência Divina?

Procurar e encontrar Jesus

É muito comum vermos igrejas lotadas de mulheres, enquanto os homens geralmente ficam nos bares, diante da tv assistindo a um jogo. Quando casamos, ouvimos que nos tornamos um só com nosso cônjuge em Cristo Jesus. O que significa isso?

A união matrimonial é mais que a união de corpos. É a formação de uma unidade de graça. Ambos os cônjuges crescem juntos e se santificam juntos, assim como se perdem juntos também. Casamento é como um barco a remo no qual cada um dos cônjuges segura um dos remos. Se não remam em harmonia não chegam a lugar nenhum.

Eu acho particularmente muito especial a passagem de Lc 2,41-52, que narra a história de Jesus perdido no templo.

Imagino quão angustiante não foi para José e Maria descobrir que seu filho de doze anos estava perdido.

Tão logo souberam disso se puseram a procurá-lo e não deve ter sido uma busca fácil. A caravana já estava há um dia de viagem e Jerusalém era uma cidade enorme; além disso havia uma grande multidão por causa da Festa da Páscoa.

Dois detalhes me chamam a atenção nessa narrativa: primeiro, eles procuraram a Jesus juntos. Não se separaram para explorar mais lugares. E em segundo, eles o encontraram no templo.

Sou da opinião de que devemos procurar a Deus ao lado de nossas esposas. Em um casamento válido, o casal se santifica junto ou separados se perdem. E é na igreja que encontramos a Jesus. Lá é a casa de Deus.

ReflexãoVocê tem procurado a Deus com sua esposa? Você e sua esposa têm buscado juntos a santidade? Vocês vão juntos para a Igreja?

O mestre do Mestre

Como todo pai hebreu, ensinar um ofício para seu filho era a atribuição de José. E assim ele o fez, mostrando a Jesus a arte da carpintaria. Mas, acredito, que mais que as técnicas, José lhe ensinou o valor do trabalho.

Todo trabalho é digno e importante. Trabalhar não é uma maldição nem um fardo, mas uma bênção.

Apesar de sabermos que José era carpinteiro, muito provavelmente ele precisou realizar outros trabalhos na falta de serviços. Afinal, por duas vezes ele precisou se restabelecer, e provavelmente não foi fácil conseguir clientes bons. Assim, imagino que algumas histórias narradas por Jesus em seu apostolado foram frutos do que ele ouvia e via acontecer em casa. Por exemplo: a parábola dos operários da vinha (Mt 20, 1-16). Quem sabe uma noite São José tenha chegado em casa cansado, mas alegre, dizendo a Maria e a Jesus que, apesar de ter passado o dia inteiro procurando trabalho, somente no último minuto recebera uma proposta para trabalhar e, por isso, ganhou um denário, isto é, o equivalente a um dia inteiro de serviço, o mesmo valor ganho pelos outros que iniciaram a jornada bem cedo. Parecia injustiça para com aqueles que haviam trabalhado o dia todo debaixo de sol, mas o patrão disse que ele bem podia fazer o que quisesse com o dinheiro dele e que ele não estava fazendo nada diferente do que havia acertado com cada um. Tenho certeza de que, por isso, José, Maria e Jesus se ajoelharam no meio da sala e começaram a louvar e a agradecer a Deus Fiel, que nunca os desamparava.

ReflexãoVocê já sentiu a presença de Deus em sua vida? Já percebeu como Ele cuida de você, apesar das dificuldades? O que significa trabalho para você?

Conclusão

O principal problema da nossa sociedade não é a falta de trabalho ou as famílias esfaceladas, mas o fato de termos criado um mundo com necessidades demais e muitas vezes vazias de sentido e sem propósito, o que nos tira o foco do que é essencial.

Muitas vezes nós suamos nossas camisas por mera aparência. Queremos ter o carro do ano, a roupa da moda …, mas esquecemos que o que importa é de graça e está ao nosso lado: nossa vida, nossa fé, nossa família, nossa saúde e bem-estar, os momentos que passamos com os verdadeiros amigos etc.

São José é exemplo de homem que soube cumprir com a sua missão. Recebeu de Deus a vocação para ser pai adotivo do Salvador e em nenhum momento reclamou ou se negou a cumprir seu papel. Na verdade, o fez com excelência, voltando-se ao essencial.

São José não fez do seu trabalho uma desculpa para se afastar de Deus, como se não tivesse tempo. Ao contrário, dedicou seu trabalho, sua paternidade e seu casamento para proporcionar um ambiente propício para que a Sagrada Família pudesse ser verdadeiramente família.

Que São José nos abençoe a todos e nos sirva de exemplo para que tenhamos fé e confiança em Deus, sejamos justos e incansáveis em nossos trabalhos, construindo e colaborando para a criação de um mundo bom para as nossas famílias. Amém.

Oração a São José

“Ó glorioso São José, digno de ser amado, invocado e venerado com especialidade entre todos os santos, pelo primor de vossas virtudes, eminência de vossa glória e poder de vossa intercessão, perante a Santíssima Trindade, perante Jesus Vosso Filho adotivo, e perante Maria, Vossa Santíssima Esposa, minha Mãe terníssima, tomo-vos hoje por meu advogado junto de ambos, por meu protetor e pai, proponho firmemente nunca esquecer-me de Vós, honrar-Vos todos os dias que Deus me conceder e, fazer quanto em mim estiver para inspirar vossa devoção aos que estão sob o meu encargo. Dignai-vos vo-lo peço ó pai do meu coração, conceder-me a vossa especial proteção e admitir-me entre os vossos mais fervorosos servos. Em todas as minhas ações assisti-me, junto de Jesus e Maria favorecei-me, e na hora da morte não me falteis, por piedade. Amém”.

Glorioso São José, rogai por nós!

Indulgências para o Ano de São José

É Ano Jubilar de São José: desde agora até 8 de dezembro de 2021, os fiéis católicos têm a graça de lucrar indulgências plenárias especiais e de crescer em devoção a este que é, depois de Maria, o maior de todos os santos de Deus.

Desejando, leia o Decreto de concessão de indulgências para o Ano Jubilar de S. José.

Saiba mais sobre o Ano Josefino. Clique aqui.

Glorioso São José

Espero que você tenha gostado e que esta mensagem tenha tocado o seu coração. Se desejar comentar algo sobre o texto, sinta-se à vontade para escrever nos comentários abaixo.

Um forte abraço e até a próxima!

Aldo Marques – catequista e membro da Pastoral da Comunicação

PS.: Originalmente este artigo foi publicado (em 2017) no site Vencer Agora que administro. Clique aqui para ler a versão original.

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